Fragmentos



"Ando muito completo de vazios.
Meu órgão de morrer me predomina.
Estou sem eternidades.
Não posso mais saber quando amanheço ontem.
Está rengo de mim o amanhecer.
Ouço o tamanho oblíquo de uma folha.
Atrás do ocaso fervem os insetos.
Enfiei o que pude dentro de um grilo o meu destino.
Essas coisas me mudam para cisco.
A minha independência tem algemas".

MANOEL DE BARROS 
em Livro das Ignorãças.



*** 
"Li em Chestov que 
a partir de Dostoievsky 
os escritores começam a luta 
por destruir a realidade. 
Agora a nossa relidade se desmorona.
Despencam-se deuses, valores, paredes…
Estamos entre ruínas. 
A nós, poetas destes tempos, 
cabe falar dos morcegos 
que voam por dentro dessas ruínas. 
Dos restos humanos 
fazendo discursos sozinhos nas ruas. 
[...] 
Porém a nós, a nós sem dúvida - 
resta falar dos fragmentos, 
do homem fragmentado que, 
perdendo suas crenças, 
perdeu sua unidade interior."

MANOEL DE BARROS 
em Retrato do Artista Quando Coisa

A vida precisa de poesia

Quero sair por aí, sem hora para voltar. Sentir o vento na cara e o corpo cheio de paz. Ver o dia morrer na beira do mar, me embriagar de harmonia. Vale a pena estar em contato com a natureza e tirar dela o melhor. Que o tempo e todas as conveniências parem bem no momento do pico, da alegria, da felicidade, pois além dessa vida burguesa e capitalista, o homem também precisa de poesia, prazer, percepção, sensibilidade, viço... Tudo que um simples olho nu pode captar! Quem sabe seria muito melhor se prestássemos mais atenção e deixássemos de frieza e medo.
Pois felizes são os que se deixam levar, que permitem a reciprocidade e o brilho no olhar.


S.O.S

Você pergunta sobre esta minha cara tensa.
Fico munda, eu sei exatamente o que eu sinto.
Seria egoísmo?
Mudança de postura, pensamentos grandiosos, ideologias fajutas.
Eu ainda não estou preparada! Mas é necessário estar preparada?
Fase de transição, novidade.
Nesse contexto, a novidade não é bem vinda.
Eu, outrora tão dona de mim...
Rendo-me, entrego-me.
Preciso aportar.